Introdução: O Contexto Teológico de Wesley
John Wesley (1703–1791), fundador do movimento metodista, desenvolveu uma teologia que equilibrava a justiça divina com a misericórdia. Sua afirmação — “Antes que eu possa pregar o amor, a misericórdia e a graça; tenho que pregar o pecado, a lei e o juízo final” — reflete uma hermenêutica bíblica que segue o padrão apostólico: primeiro a convicção, depois a consolação (cf. Atos 2:37-38). Este estudo examinará os fundamentos escriturísticos e históricos dessa abordagem, evitando deliberadamente perspectivas calvinistas e concentrando-se na tradição arminiana e patrística pré-agostiniana.
A Função da Lei na Pregação (Romanos 3:20; 7:7)
Wesley via a Lei como um instrumento divino para:
- Revelar o pecado (Romanos 3:20) — A Lei expõe a incapacidade humana de alcançar a justiça de Deus.
- Conduzir a Cristo (Gálatas 3:24) — Ela atua como um paidagogos (tutor) que nos leva ao Salvador.
- Guiar a santidade (Salmo 119:105) — Para o crente, a Lei não é um jugo, mas um caminho de vida.
Irineu de Lyon (Contra as Heresias, Livro IV) argumentou que a Lei foi dada não para escravizar, mas para educar a humanidade até a vinda de Cristo. Wesley ecoou essa ideia, ensinando que a Lei prepara o coração para a graça.
O Juízo Final Como Chamado ao Arrependimento (Atos 17:30-31; Hebreus 9:27)
Wesley não pregava sobre o juízo para incutir medo irracional, mas para despertar a consciência moral. Em Sermão 15: The Great Assize, ele descreve o Juízo Final como um evento em que a justiça divina será plenamente manifesta, mas também como um convite à reconciliação. Crisóstomo (Homilias sobre o Evangelho de Mateus) ensinava que a lembrança do juízo é um remédio contra a negligência espiritual.
A Graça Supõe o Reconhecimento da Queda
Ambrósio de Milão (Sobre a Fuga do Mundo) escreveu que “ninguém busca a cura se não reconhece a doença.” Wesley, seguindo essa linha, sustentava que a graça só é verdadeiramente apreciada quando o pecador percebe sua necessidade. Ele rejeitava a ideia de uma graça irresistível (como no calvinismo), mas afirmava que o Espírito Santo convence “do pecado, da justiça e do juízo” (João 16:8), levando a uma resposta voluntária de fé.
Críticas Modernas e Respostas
Alguns teólogos contemporâneos (e.g., Rob Bell, Love Wins) minimizam o ensino sobre o pecado e o juízo, preferindo uma mensagem exclusivamente positiva. No entanto, essa abordagem ignora:
- O padrão apostólico (Pedro primeiro confronta o pecado em Atos 2 antes de oferecer graça).
- A integridade da mensagem bíblica (Jesus começou Seu ministério com “Arrependei-vos” — Mateus 4:17).
- O risco do antinomianismo (a graça sem lei pode levar à libertinagem — Judas 1:4).
Conclusão: O Equilíbrio na Pregação Wesleyana
Wesley não pregava a condenação por prazer, mas porque entendia que só os que reconhecem sua ruína clamam por um Salvador. Sua metodologia reflete o modelo bíblico:
- Lei → Convicção (mostrar o pecado).
- Graça → Redenção (oferecer perdão).
- Santificação → Vida transformada (a resposta do crente em amor).
Como ele mesmo declarou: “Não há santidade sem justiça, nem misericórdia sem verdade.” (Sermão 34: The Original, Nature, Property, and Use of the Law).
Fontes
- WESLEY, John. Sermons on Several Occasions. 1771.
- IRINEU DE LYON. Contra as Heresias. Século II.
- CRISÓSTOMO, João. Homilias sobre o Evangelho de Mateus. Século IV.
- AMBRÓSIO DE MILÃO. Sobre a Fuga do Mundo. Século IV.
Este estudo demonstra que a abordagem de Wesley não era legalista, mas profundamente bíblica e pastoral. A Lei prepara o caminho para a graça, e o juízo é um chamado amoroso ao arrependimento antes que seja tarde demais.